E a história que Madrinha mais gostava de me contar, é que ela me dava angu para comer pelo buraco da cerca, no quintal.
E quando eu vim para BH estudar, as palavras dela forma: "Olha aqui, minha filha, você pode estudar, ficar importante o quanto quiser, mas não fique "mitida" (mitida no dicionário serrense da época era orgulhosa, julgando-se melhor do que os outros) porque eu vou contar pra todo mundo que você de pequininha passava fome porque sua mãe pensava que tudo ia lhe fazer mal e eu lhe dava angu pelo buraco da cerca e você comia com satisfação!" (...)
Agora, eu entendo,quando fui ficar uns dias com D. Maria quando Zé Cária morreu e eu a encontrei tranqüila e serena; entendo também a serenidade de Guerrinha quando nos encontramos numa passeata de greve e ela me perguntou se eu sabia que ela havia perdido Mazzarello. Dalva quando pardeu os três filhos e uma netinha em acidente. E tantas outras pessoas amigas que perderam entes queridos e eu ficava me perguntando como podiam suportar com serenidade. Agora entendo; a serenidade é só por fora; uma espécie de "abobamento" . Por dentro, é dor só. Dor, dor e mais dor. O sentimento é de que arancaram um pedaço de mim que eu não sei qual, nem onde está. E junto com a saudade de Carminha, vem uma saudade danada de papai, mamãe, Doinha, Tarcísio, Tia Lili, Madrinha Tereza, Padrinho Nutinho, meus avós, todas as pessoas queridas que já se foram. Agora é que parece que eu tomei consciência da partida de todos eles, realmente. Agora também é que realmente eu tenho certeza que sou mortal. Antes eu tinha absoluta trnqüilidade que Carminha e eu viveríamos mais de 90 anos como mamãe e várias de nossas antepassadas. Certa vez, ela chegou a me dizer: "Eu nunca vou dar conta de morar junto com você. Mas eu tenho duas amigas que compraram apartamentos no mesmo prédio,um em frente ao outro e eu achei uma idéia ótima!" Pude perceber o que ela pensava para nosso futuro. Também eu tinha absoluta certeza que chegaria, pelo menos aos 80. Agora é que tomei consciência, apesar de ter convivido tanto com Doinha que repetia sempre que nunca sabia se estaria viva no dia seguinte, que posso partir a qualquer instante, que não tenho garantia nenhuma nem para amanhã, nem para esta noite...
O que me ocorre é que quando eu me encontrar no Céu com Madrinha Chiquinha poderei dizer a ela que segui seu conselho e não fiquei “mitida”. Posso afirmar isso com certeza, e dando como testemunho as inúmeras amizades que continuei conquistando no decorrer da vida. Amizades de todo o tipo: pessoas ricas, pobres, crianças, idosas, homens, mulheres e de todas as cores. E continuo carregando comigo saudades sem tamanho dos amigos...
Extraído do livro "Lembranças" - Rosarinha Brandão
Foto: Mamãe e Elisa em BH, sendo homenageada pela APPMG como Educadora Destaque
Oi Roger, belo texto. Há tanta gente que fica "mitida", por pouca coisa. Conheci pessoas que tinham muito para ser "mitido", e no entanto eram pessoas tao simples, mas tao simples, que ficava de queixo caído.
ResponderExcluirEita, que eu e o meu amdo estamos lindos por aqui, rs.
Bom dia para vocês!!!
Agora que a blogagem passou terei um pouquinho mais de tempo...
Abracos
Então Roger..
ResponderExcluirNão querendo ser "mitida" (rs), tenho sim as manhas para colocar o tradutor caso vc mesmo não consiga pelo tutorial do Dicas da Mama.
Preciso de seu código e senha.
mamanunes@gmail.com
Beijos e boa semana a vocês!
Roger querido.... vc sempre nos encantando com suas palavras...
ResponderExcluirabraços carinhosos pra vc
O texto é carregado de sentimento e sentido. Não posso ler muito essas coisas, a gente fica pensando calado... Estou por aqui, embora não tenha escrito tanto em meu blog ou neste teologia-livre. Mas, se posso guardar em meu coração algo precioso dessa nossa virtual e recente convivência, é a certeza de que o amigo Roger é uma pessoa muito sensível. Pelo menos é o que me parece ao ler suas palavras e citações. Algo como "entranháveis afetos". Um abraço.
ResponderExcluirNó céu não há lugar pra "mitidez". Belíssimo texto.
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