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quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Réu Confesso

Estou foragido do Brasil pelos crimes que cometi.

Delicio-me vendo aqueles presidenciáveis se digladiando frente às câmeras, se auto-acusando ou autopromovendo na tentativa de achar as causas ou as soluções para os problemas, dos quais só eu sou culpado.

Meu envolvimento no mundo do crime se deu ainda bem cedo.

Já na escola, enquanto caxias, tratei de usar do sistema e de suas regras institucionais para me autopromover. Lição que me auxiliou a vida inteira dentro das instituições públicas e até mesmo das privadas, das quais fiz parte ou me envolvi.

Mas na rua (e também na escola) soube espertamente compor a malandragem. Burlei todas as leis, fiz da vida de meus superiores um inferno. Fui o rei de meu próprio império. Vejo-me culpado pelo tráfico de influência, propaganda enganosa e improbidade administrativa.

Obviamente não poderia ter feito (ou “não” ter feito) tudo aquilo sozinho. Aliciei e fui aliciado. Confesso o crime de formação de quadrilha.

Fui eu quem, como elite, olhou com dó, mas também com desprezo para as massas. Mas como parte da massa, fui eu também que olhei com ódio e desprezo ainda maior para as elites.

Fui eu quem invejou o sucesso alheio, e por isso tratei de construir também o meu, de forma artificial e ilícita. Afinal, o alheio foi galgado também assim. Certo?

Calei-me, quando deveria ter alçado a voz. Omiti-me. Sempre houve uma boa causa para eu me refugiar e fazer de conta que ajudava alguém, enquanto beneficiava, no fundo, era a mim mesmo.

Desviei verba, sim. Das quantias pequenas e insignificantes até as milionárias. Qualquer um em meu lugar teria feito o mesmo. A história está aí e prova isso. Fiz caixa dois. Soneguei.

Mas quem não sonega? Já disse, faço parte de uma quadrilha.

Hoje, quando assisto pela internet a um debate de presidenciáveis, onde nos é esfregada na cara toda a miséria em que se encontra o Brasil, me volta [e revolta] à memória a perversidade de meus crimes.

Os presidenciáveis... Todos, bem intencionados ou não, sendo levados [por nós] a fazerem promessas de salvação para a Nação. Como se uma única pessoa, pudesse pelo seu simples poder, alavancar outras tantas que influenciariam outras, e por meio de decretos e portarias e orçamentos, concertar tudo aquilo que nós fizemos questão de desmoralizar no Brasil.

Sim, confesso, sou culpado de avacalhar com o Brasil. Se o Brasil está do jeito que está, é por minha causa.

Aqui, vivo longe de minhas vítimas e de meus algozes e só serei atormentado pelo tribunal de minha própria consciência. Afinal, eu mesmo, um dia já fui Brasil.

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