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quarta-feira, 28 de junho de 2017

O Objeto do Sujeito

Em uma análise sintática os termos assessórios podem ser os elementos mais básicos.

Havia um amontoado de coisas para serem jogadas fora. Mas nem tudo. Em meio àquelas tralhas todas, tentava-se salvar o que aparentava algum valor.

Eram objetos. Velhos e usados. Guardados em caixas de papelão. A primeira caixa foi aberta.

Um álbum de fotos. Fotos em preto e branco, um álbum de capa dura, empoeirada. Era preciso assentar-se para examinar aquilo.

A mão trêmula pegou virou a primeira página do álbum e os olhos miraram naquelas fotos presas pelas pontas com pequenos triângulos de papel, um assombro percorreu a alma, transportando-a a décadas atrás. Pequeno sentado no colo da mãe, rodeado dos irmãos tentava decifrar aqueles personagens sorridentes. Outros sérios vestidos de terno. Na frente sua própria foto. Sentiu-se novamente minúsculo, preso àquela atmosfera confiante.

Olhou ao redor e viu outra caixa. Outro álbum, agora não de fotos. Uma coleção de selos. Veio à lembrança aquela manhã de sábado onde o avô afirmara ter o “olho de boi” e dar início a uma caçada frenética por meio de velhas caixinhinas de remédio cheias de selos rasgados de envelopes. Não tinha o “olho de boi” mas a coleção foi organizada em um álbum.

Na outra caixa um tabuleiro de xadrez. Onde as peças lembravam a mão trêmula do mesmo avô prestes a perder uma partida. O sorriso maroto do pai prestes a ganhar uma. As tardes no calçadão da praia sentindo a brisa do mar e desafiando o irmão para mais uma rodada.

Outra caixa. Um velho jogo de bingo. Quando o pai reunia a família e cantava os números com a alegria de quem estivesse rifando um carro zero. Na outra caixa um gravador com fitas de rolo. Na outra um mimeógrafo. E o cheiro de álcool lembrava a escola e a lista escolar e os exercíos e os Para-Casas que vinham em papel mimeografado.

Lá no outro canto estava uma frasqueira com objetos de costura da avó, linhas, agulhas e agulhas de crochê. Um gorrinho pela metade, trouxe um sorriso de canto de boca, lembrando quando ela sonhava em fazer um gorrinho para cada menino da rua e faturar uns trocados.

Eram objetos. Um barbeador que ao rodar a ponta do cabo ele abria para que se colocasse uma Gilette. Quem sabe não era do avô, que ele contemplou várias vezes admirando a força daquele homem que venceu na vida com um braço só, e agora se barbeava novamente e vividamente em sua memória.

Um alçapão para pegar os canários chapinhas, e lembrar a febre contagiante por passarinhos que o tio trouxera consigo, ao mudar para casa da rua debaixo.

Uma velha forma de bolo. Uma máquina de escrever. Um ferrinho de soldar e uma coleção de revistas de eletrônica.

Um chapéu. Um guarda-chuva. Um canivete. Uma máquina de costura. Cada objeto com sua lembrança, com sua história, com seu sujeito. E seu valor sentimental intrínseco e incalculável.

Naquela liturgia os objetos eram os sujeitos da oração.

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