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domingo, 11 de janeiro de 2009

Os Aventureiros e os Transgressores

Em uma conversa com P. Brabo (via E-mail) e em outra com A. Nicodemos (via comentários) me vi embaraçado com estes dois rótulos: aventureiro e transgressor.

Nada como ter o privilégio de dialogar com gente, especialmente com aqueles que pensam de forma diferente da nossa! Ou não?

Não sei o que você pensa, mas eu particularmente acho interessante me aproximar de gente que galgou certo respeito na sociedade. Na minha época de militância estudantil tive a oportunidade de ter contatos relâmpagos com ministros da Educação e Deputados Federais e um ou dois artistas de fama nacional. Sempre me alegrei com isso.

O bate papo com Brabo se deu na esfera privada, como de costume, graças à sua generosidade em responder meus E-mails e sua insistência em “fechar a barraquinha” para os comentários da Bacia. Sempre é um prazer ler e dialogar com aquele monge. Desta última vez questionei a história da transgressão de Deus em A grande revelação. Será que eu havia lido errado? Pois bem, sua explicação é que não se pode confundir transgressão com pecado. E que a história teria um desenrolar que esclareceria (ou escureceria) mais ainda as lacunas abertas. Só me acalmei por completo, hoje, quando achei no meu Aurélio de Bolso uma definição de “transgredir” que casa com o caráter de nosso Deus: “passar além de; atravessar”. Achei isso fantástico, pois essa é justamente a tônica que buscamos dar a este Blog: o espírito aventureiro de ir além e atravessar as fronteiras, de transgredir.

Isso nos remete ao segundo bate papo, com Nicodemus. Se você tiver saco e interesse fiz uma sistematização abaixo, recortei e monteio-o em uma forma que, espero, não tire a autenticidade da conversa. Para sentir o tom e teor de forma mais fiel cofira a íntegra dos comentários no link fornecido.

(Em verde estão as falas de Nicodemus. Em preto e itálico, as minhas.)

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Parte do texto Postado por Augustus Nicodemus sob o título, Relativismo, Certeza e Agnosticismo em Teologia.

clip_image002[a ser publicado no site da Editora Mundo Cristão]

Tenho sempre me deparado com pastores e teólogos que acreditam que teologia boa é só aquela que está sendo feita agora. ... o relativista declara com toda autoridade e convicção que “não existe verdade absoluta, tudo é relativo”.

Não me entendam mal. Eu também acredito que a teologia é um construto humano, e como tal, imperfeito, incompleto e certamente relativo. Estou longe de adotar para com a teologia reformada uma postura similar àquela que considera a tradição aristotélica-tomista como a filosofia e/ou teologia “perene”. Eu também considero que a teologia é fruto da reflexão humana e, portanto, sempre sujeita às vulnerabilidades de nossa natureza humana decaída. Mas não ao ponto de não poder refletir com uma medida de veracidade e fidelidade a revelação de Deus nas Escrituras. O problema com essa postura relativista é que ela desistiu completamente da verdade. É agnóstica. [...]

Mas, os teólogos relativistas acreditam em que? Em tudo e, portanto, em nada. [...]

Uma última dificuldade que desejo mencionar é que essa visão, se levada às últimas conseqüências, acaba nos privando da Bíblia. [...]

Eu admiro e respeito os antigos liberais. Os de hoje, precisariam assumir o discurso relativista e levá-lo às últimas conseqüências. Pode ser que não conseguiriam absolutamente nada com isso, como acho que não vão conseguir. Mas, pelo menos, teriam o meu respeito – se é que isso vale alguma coisa.

Caro Augustus,
O teor da postagem é a mesma, da qual há tempo vínhamos conflitando-nos: relativismo X verdade absoluta.
Começarei pelo finalzinho: sem dúvida o respeito seu e de qualquer pessoa vale alguma coisa. Respeito não significa concordância e é uma das bases da tolerância que a sociedade pluralista relativista de hoje exige.

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Li todo o texto e haveria vários pontos a serem levantados, mas me limitarei a poucos:
1) Não existiria somente uma, a verdade absoluta, que é o Verbo que se fez carne?

Roger,
Respondendo a seus pontos:
1) A encarnação de Cristo é apenas uma das verdades de uma série de outras, que compõem os atos salvadores de Deus na história, que chamamos de história da salvação. Quando Cristo diz que ele é a verdade, o faz em contra-distinção à mensagem farisaica, mas não no sentido que a vinda dele ao mundo representa o único fato verdadeiro jamais ocorrido. Esses atos salvadores de Deus estão registrados nas Escrituras, que recebemos como verdade absoluta. E elas narram mais do que a encarnação do Verbo.

1) temos que distinguir “a encarnação de Cristo” de “o Cristo, o verbo encarnado”. Me refiro à segunda expressão, à pessoa de Cristo, e não somente ao fato de sua encarnação.

2) Portanto não estariam todas as outras coisas (e a percepção delas) a priori relativas ou subordinadas a essa Verdade?

2) Portanto, seu segundo ponto fica prejudicado, a não ser num aspecto, que as percepções, todas relativas, são verdadeiras à medida que refletem mais fielmente as verdades reveladas por Deus em sua Palavra.

2) O ponto então permanece. Pois não nego a veracidade dos fatos. Alguém faria isso?? O ponto é justamente a percepção e interpretação deles! Nesse sentido a verdade salvadora da Bíblia é uma verdade relativa, relativa à pessoa de Jesus (que é o Salvador). Creio que quanto a isso estamos de acordo.

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3) Se são relativas não perderiam então seu caráter absoluto? Assim até mesmo no campo ético não foi Ele quem enfatizou a maior importância daquilo que é subjetivo sobre o que é objetivo e evidente?

3) Eu não disse em lugar algum do post que existem percepções absolutas. Ao contrário, afirmei que as teologias são relativas pois são construtos humanos. O que eu estou negando é o relativismo radical imputado aos contrutos teológicos a ponto de virarmos agnósticos e desesperarmos de conhecer a verdade. Como afirmei no ponto 2 acima, a teologia, mesmo sendo incapaz de refletir perfeitamente a verdade absoluta, pode refleti-la inda que em parte, quanto mais próxima da Palavra ela for.

3) O que ressaltei neste ponto 3 foi justamente isso que você vem a afirmar “as teologias são relativas pois são construtos humanos.” E que as construções, tanto como resultado ou como processo tem valor. Mais uma vez então, acho que concordamos.

Não estamos de acordo, infelizmente. Mas, não vou gastar tempo com isso. Os leitores podem julgar e avaliar.

Assim as teologias são de fato relativas, e marcos antigos não ajudam muito aos “aventureiros”. E explorar esse oceano que ainda não foi navegado é a proposta de nosso novo Blog, Teologia Livre.

E de fato, você tem razão, marcos antigos nunca ajudaram os aventureiros, especialmente em se tratando de marcos bíblicos.[…]

* note que em meu post "aventureiros" está em itálico. Isso lhe dá um sentido especial que facilitaria o entendimento. Mas creio que percebi seu humor!rs

Continuo firme na teologia histórica da Igreja, provada e comprovada pelos séculos. Gosto de aventuras. Já tive Land-Rovers, visitei com eles o Pantanal, Lençóis Maranhenses, etc. Gosto de motos, hoje tenho uma Harley-Davidson e gosto de viajar. Mas em teologia, não gosto de aventuras. […]

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O nome de seu blog, "Teologia Livre", me parece uma contradição em termos, a menos que eu esteja enganado. Pois nele encontrei sua clara dependência de antigos teólogos liberais do século XIX e XX. É evidente que não se trata, portanto, de uma questão de antiguidade, mas de conteúdo. Você quer uma teologia livre para 2009, mas isso quer dizer livre da teologia tradicional e presa à liberal alemã, que também é antiga.

* Sob sua percepção sobre a liberalidade de nosso Blog, tenho que respeitar, com uma ressalva que, talvez, para um verdadeiro teólogo liberal nosso Blog seja por demais conservador.

Nosso (e penso que vosso também) problema está em que queremos valorizar mais o resultado da descoberta teológica do que o processo do descobrimento. Mas ambos são importantes. Os debates dos primeiros séculos sobre a trindade, se desenrolados hoje teriam outros elementos, outro tempero. Ainda que os resultados sejam semelhantes nunca seriam os mesmos! Aliás, nem sei se o termo debate caberia hoje. Mas nada impede que hoje a questão da trindade aflore no coração de indivíduos, em seu contato com o mundo islâmico, por exemplo, e isso leve a novas perspectivas da pessoa, natureza e substância divinas.

Sobre a Trindade, estou curioso para conhecer a sua nova proposta em contatos com o mundo islâmico, sobre a pessoa, substância e natureza divina. Aguardo.

* Satisfazendo sua curiosidade, a pouco tempo ouvi de um missionário brasileiro que aqui confrontou um muçulmano nessa questão. Ele usou o exemplo do sol, que se nos apresenta em três formas: a luz, o calor e o astro.

A única coisa que preciso comentar é que você está provando meu ponto, que os relativistas não têm nada novo para acrescentar. Você apresenta como "novidade" sobre a Trindade uma das mais antigas ilustrações usadas sobre a Trindade, que é essa do sol. Já era usada nos primórdios do Cristianismo.

Finalizando digo que sua postura pode parecer bem com a escola cristã de Alexandria, ao platonismo, que buscava as idéias imutáveis e as verdades eternas. Por outro lado os “progressistas” lembrariam a escola de Antioquia que queriam uma coisa mais aplicada à realidade histórica. Mas quanta distância, temporal, geográfica, cultural disto tudo...
Não a situação é hoje mesmo outra e você é um dos principais formadores de opinião no Brasil (cristão evangélico) seu respeito vale alguma coisa, sim.

Acho que você está fazendo uma confusão enorme entre as escolas. Alexandria, platônica, buscava a verdade além da letra, na alegoria, que permitia relativizar qualquer texto e abrir uma multiplicidade de sentidos ao intérprete. Eles é que eram os relativistas. Já os antioquianos, entendiam que os textos tinham apenas um sentido, que era o sentido literal, simples, do texto. Os alexandrinos é que eram, quanto à interpretação da Bíblia, relativistas e pluralistas.

*Finalmente a questão de Alexandria e Antioquia: não há confusão nenhuma. Você está correto no que diz respeito àquilo que pensavam sobre a interpretação do texto bíblico, mas não tem como fugir do fato de que, em sua busca pelas “idéias imutáveis” e as “verdades eternas” (que estavam além das sombras da caverna), os platonistas estavam buscando as verdades absolutas, as idéia imutáveis. Mas como disse, esse é um debate distante.
Saudações fraternas,
Roger

Abraço.

6 comentários:

  1. Cara, já tivemos (vários de nós) oportunidades de ficar calados quando se trata de conversar com esse pessoal. Eles só crêem em uma verdade: a deles. Pior será sermos obrigados a conviver com eles, caso haja mesmo uma vida eterna.

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  2. Lou,

    esse é meu problema desd´a escola. Mal consigo ficar calado...

    Essa foi a piadinha da pregação do culto de hoje: No céu os crentes terão perfeita comunhão. Esse é o problema. Dizem que uma multidão de crentes estarão lá... às vezes é dificil conviver com meia dúzia!

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  3. Perco os amigos, mas não a piada, que é de Mark Twain:

    "Prefiro o céu pelo clima e o inferno pela companhia."

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  4. Roger,
    O que dizer? No Mackenzie não dizemos nada, porque não compensa. Após um período em que tentamos conversar como nossa "hierarquia", agora nós simplesmente ouvimos e descartamos o que não nos convence...
    Mas há algo que eu tenho que expresar: o meu riso! Ri muito quando você colocou que o Nicodemus é da escola de Alexandria. No Mackenzie (e acredito que em toda a instituição presbiteriana), aprendemos que usar alegoria é um sinal bem claro de que você não é um bom pregador, e nem deve ser um bom cristão, o que praticamente o caracteriza como um não-eleito.
    E só os eleitos interessam para eles!

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  5. Querida Nani,

    será que sou tão cabeçudo assim?! (todo mundo só fala a mesma coisa: não compensa, é perda de tempo). Já estou quase chegando a essa conclusão.

    hehehe! Sobre a questão de Alexandria nem fazia idéia!! Nem tive tanto a intenção de provocar assim (geralmente os rótulos provocam) mas é que me pareceu mesmo haver alguma semelhança.

    Um grande beijo pra ti,

    Roger

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  6. Roger, meu caro...
    Seu esforço no diálogo foi muito corajoso e humilde. Parabéns!
    Como disse, nós desistimos disso no Mackenzie. Nos tornamos apáticos em relação a nossa administração. E isso não deveria ter acontecido, mas depois de 2 ou 3 anos tentando, já estávamos no final do curso. No nosso caso, eles nos venceram por cansaço.
    Graças a Deus existem pessoas como você, que não se deixam abalar.
    E não se calam!
    Beijão!!!

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