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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Mundo perfeito

Nesta casa diante da qual passo pela primeira vez
Caminhando nesta rua que é qualquer uma
Mora um homem pequeno de tremenda gentileza
E formidável força
Que desconhece por completo seu verdadeiro rosto
E seu papel nestas possibilidades.
Esse homem seria um indomável companheiro
Que me faria conhecer as graças da lealdade
Que me repartiria a alma e me estenderia o seu prato
Ele que voltaria na batalha para resgatar minha carcaça
E derramaria por mim o seu sangue.

Nesta, que tem um arco na varanda e samambaias
E um gato
Mora a mulher que me escolheria entre a morte
E me amaria até morrer, e amando-me morreria.
Ela cujo sorriso me compreenderia e me faria compreender
Cujo seio anseia por minha mão
E por cujo seio anseio sem saber;
Ela que de bom grado ao meu lado restaria
E faria com as mãos ponte precária entre a vida e a morte
E para não me ver morrer
Derramaria de si o meu sangue.

Nesta, nessa e naquela
Moram os filhos que seriam meus
Que eu faria crescer entre os dedos
Que me fariam desesperar e me dariam louvor
Até que me dessem as costas
Até que se arrependessem
E voltassem como estranhos com pratos de sopa
Soltando sorrisos antigos
E retornando comigo a praças que não existem mais.

Nesta casa, ou naquela dos fundos
Mora o cachorro que me é de direito
E que se chama Feliz;
Por esta janela quase entrevejo o berço que nunca construí
E naquela estante o livro que não comecei.
Nesta casa mora meu mestre, nesta meu algoz,
E seriam talvez pessoas diferentes.

Eis outra rua!
Dobrei a esquina sozinho.

Tirado daqui do Paulo Brabo

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