C.S. Lewis dissera que teologia é como o mapa do oceano. Ele comparava Deus ao mar. Você pode conhecer o mar observando-o da praia, e se maravilhar com ele, mas se quiser explorá-lo em sua grandeza terá que adentrá-lo tendo em mãos um mapa. Esse “mapa”, na espiritualidade, seria a experiência registrada e acumulada pela teologia cristã. Cherteston chega até mesmo a comparar sua viagem espiritual como quem saiu do porto de Londres sem um mapa e sem um guia em busca de novas terras e novos mares e após muito navegar termina “descobrindo” o próprio arquipélago britânico de onde saíra. Com isso afirmava que, em espiritualidade não há nada novo, nem há como negar a sabedoria de séculos acumulada na ortodoxia cristã.
Fiquei pensando que, de fato, a melhor maneira e a mais convencional para se atingir o pico seria pegar um daqueles teleféricos. Mas lá do alto percebi que haviam inúmeras trilhas que também te fariam chegar ao pico, e ao mesmo tempo te proporcionavam uma experiência menos padronizada e mais personalizada para desfrutar de todo aquele cenário com mais intensidade. O teleférico é a sistemática, padronizada, dogmática, rígida te leva de A a B. Funciona e é útil. É usada pelas massas. As trilhas também ligam A a B, mas elas não te levam é você quem caminha com suas próprias pernas. Elas são flexíveis, são múltiplas e em certos momentos únicas, sem registros cartográficos.
A cada montanha que subimos com Jesus Ele nos revela uma faceta diferente de Deus.
No Monte da Transfiguração Ele reflete a glória de sua majestade. O brilho de suas vestes brancas nos mostra a pureza de todo o coração, de quem contempla ininterruptamente o Pai. Ao pé do Monte das Oliveiras, no Getsêmani, Ele derrama seu suor, que se torna em grandes gotas de sangue. Ali, Ele nos revela toda sua força que o movia persistentemente em direção à vontade de seu Pai. No Gólgota Ele derrama seu sangue, mostrando-nos toda sua alma repleta de amor, nada mais que o mais puro e sublime amor.
Subir montanhas com Jesus é ver o Nazareno amando o seu Deus de todo seu coração, de toda sua alma, de toda as suas forças e todo o seu entendimento. Sim, Ele também nos entrega todo seu entendimento doutrinário, sua teologia, lá na Galileia, no Sermão do Monte.
Subir o monte, hoje, com o Mestre Jesus para ouvir o seu sermão é algo muito especial e sagrado. Ali Jesus nos dá a entender os mais altos padrões cognitivos da perfeição divina.
Já na antiguidade El Shaddai dissera a Abraão, sede perfeito! No monte, Jesus só reforça essa ordem, esse desejo divino, e fixa os padrões da perfeição que esperava: Sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai que está nos céus. Mas como podemos ser perfeitos? Seria isso uma figura de linguagem uma hipérbole?
Não. Jesus não estava brincando, nem exagerando. Essa é a real demanda do Mestre. Mais não seria possível, menos não interessaria.
Para nós seres humanos, falar em perfeição parece arrogância. Um colega meu da faculdade gostava de brincar dizendo que seu alvo era ser perfeito, e sua primeira tarefa era vencer a pretensão...
É possível ser perfeito, sem ser pretencioso? Esse é justamente o primeiro nó que Jesus desfaz em seu Sermão do Monte. Ser perfeito não é ser arrogante ou pretencioso, é justamente o contrário, é ser pobre de espírito. Jesus começa pontuando que os pobres são agraciados com o Reino dos céus. Bem-aventurados vós, os pobres (os que nada tem), porque vosso é o Reino de Deus (Lucas 6:20). Uma coisa implica na outra. A pobreza de espírito implica em possuir o Reino dos Céus e possuir o Reino dos Céus implica na pobreza de espírito. Possuir o Reino dos céus é uma simples questão de graça divina, de amor.
Novamente: possuir o Reino dos céus nunca foi e nunca será um festival de vaidades. Segundo Jesus, possuir o Reino dos Céus é uma escancarada demonstração de pobreza de espírito, que só depende da graça e do amor divinos. Esse será sempre o primeiro passo na trilha da perfeição.
Jesus aponta outras oito características de seus discípulos, dos padrões da perfeição esperada. A perfeição divina. Mas afinal de quem Jesus falava?
É evidente que quando falamos dos outros, revelamos muito mais sobre nós mesmos. Por isso nas Bem Aventuranças Jesus está falando menos dos discípulos e bem mais de si mesmo (sua pobreza de espírito, seu sofrimento e choro, sua mansidão etc.). Ao falar de si mesmo, Ele nos revela em essência quem é o Pai, e em revelar o Pai, Ele nos relembra exatamente quem somos, pois o nosso DNA espiritual é nada mais que uma herança paterna.
Pois bem, nas Bem Aventuranças Jesus se “denuncia” um inveterado pobre de espírito, sofredor, manso, faminto e sedento por justiça, misericordioso, puro de coração, pacificador, perseguido por causa da justiça e por causa do Evangelho.
Ao andar por um mundo dominado pelo mal, em uma realidade cruel e decaída, Ele também toma voluntariamente e vicariamente sobre si o castigo do pecado, Ele é feito pecado.
Sendo assim, Ele também se mostra possuidor do Reino dos céus e das promessas de consolo, de herança do reino terrestre, de satisfação por justiça, de misericórdia, de capacidade de ver Deus, de ser chamado Seu Filho e de alegria pelo grande galardão do porvir, quando o domínio do mal será plena e definitivamente subjugado e aniquilado.
Adentrar o Sermão do Monte é aventurar-se nas trilhas da incomparável lógica doutrinária do Rabi judeu, o grande Rei de Israel, o Messias.
Conhecê-lo pelas trilhas das Bem Anventuranças é bem mais que subir apressadamente uma montanha pelo teleférico da dogmática. A bem da verdade ambas as vias proporcionarão um panorama geral de um Deus onipresente, onisciente e onipotente, de um Deus tri-uno. Mas é passo a passo pelo Sermão do Monte que vocês estarão andando na companhia do Mestre, de mãos dadas com Ele. Não estudando o quê Deus é, mas se relacionando diretamente com Ele e aprendendo quem Deus é.
Bem aventurados sois vós!
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