Meu caro amigo, seu desabafo me fez lembrar o título de um livro, o qual apontava a perfeição como um fardo. Venho ouvindo esse desapontamento já há algum tempo de várias pessoas amigas. Ele assume diversas variantes: a verdade absoluta não existe, justiça não existe etc. Para mim tudo isso equivale a dizer que Deus não existe. E essa afirmação vinda de você torna-se especialmente perturbadora.
Foi o pastor Carlos McCord quem, com o auxílio do missionário Stanley Jones, me abriu os olhos para a necessidade de me reconciliar com a perfeição. Eles partem do princípio de que o centro do Sermão do Monte está no chamado à perfeição:
"Sede perfeitos, como é perfeito o vosso Pai que está nos céus".
A pergunta é, o que entendemos como perfeição? O que Jesus queria dizer com perfeição? Não precisamos ir muito longe para acharmos a resposta. Basta consultarmos o texto paralelo do Evangelho de Lucas para ver que ali Jesus está dizendo, “sede misericordiosos, como é misericordioso o vosso Pai celestial”. Nos Evangelhos, perfeição é sinônimo de misericórdia! E o que seria misericórdia senão uma atitude amorosa em relação à imperfeição (alheia ou própria)?
Concluímos que nos Evangelhos – ou seja, nas palavras de Jesus – ser perfeito é admitir, paradoxalmente, nossas imperfeições e darmos a elas uma resposta amorosa. Quanto mais nos aperfeiçoamos nisso, mais nos tornamos semelhantes ao nosso Pai celestial.
Para sermos misericordiosos com nosso próximo, precisamos de alguma forma também ter experimentado a misericórdia. Então, precisamos também estar cientes de nossas imperfeições, e sabermos que somos aceitos graciosamente apesar delas (ou até mesmo, por causa delas). Um Deus perfeito não está nos imputando imperfeições. Ele não as leva em conta, pelo contrário, por sua graça, está removendo-as, cobrindo-as. De maneira tão perfeita, que nem se lembra mais delas. Como alguém já disse, Ele vê em nós o rosto de seu Filho Jesus. Portanto, perfeitos!
Sendo assim, “GRAÇA E PERFEIÇÃO sempre ocuparão o mesmo espaço”. Se há graça, há sinais de perfeição e vice-versa. A graça que recebemos é o que nos permite ser graciosos conosco mesmo e com nosso próximo. Toda culpa e vergonha nos são removidas. Passamos então a nos sentir... como poderia dizer? Perfeitos! E é assim também que nos dispomos a ser e a olhar nossos irmãos (a igreja) e até mesmo nosso próximo (o mundo). Olhamos o mundo ao nosso redor com o olhar da graça. Não com o olhar condenatório. Nosso foco está na perfeição de cada um e não em suas imperfeições. Tornamo-nos capazes, através da obra da cruz, à semelhança de nosso Pai celestial, de enxergarmos o melhor em cada um. E nada mais. E quando a realidade dos fatos prova o contrário, podemos confiantemente deixar o juízo e a vingança plenamente nas mãos de quem verdadeiramente os detém.
Caro amigo, não há como desistirmos da perfeição! Ela é algo de nobre que Deus colocou em nosso DNA. Sei que você é um profundo estudioso da Bíblia. Sei que você conhece as passagens que irei relembrá-lo. Você se lembra? O apóstolo Paulo diz que escreve para os perfeitos e em um mesmo fôlego afirma que quanto a ele ainda não alcançou o alvo, mas prossegue em sua direção.
Você se lembra? A Bíblia está aí para ajudar ao homem de Deus ser perfeito, e perfeitamente instruído.
Você se lembra? Deus diz a Abrão, anda em minha presença e sê perfeito.
Poderíamos também resumir perfeição como a plena e constante obediência aos mandamentos divinos. Deus nos deu dez indicadores de perfeição! Sempre seremos capazes de nos autoavaliar e vermos como avançamos ou regredimos em nossa performance na busca pela perfeição.
Os Evangelhos deixam claro que os mandamentos se resumem em dois: Ame o Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todo o seu entendimento. E ame o seu próximo como a si mesmo.
Creio que não foi por acaso que, quando o jovem rico pergunta a Jesus o que ele precisaria fazer para alcançar a vida eterna, Jesus pergunta-lhe sobre os mandamentos. Também não creio que foi por acaso que Jesus menciona somente os mandamentos que dizem respeito ao relacionar com o próximo, deixando de lado os que dizem respeito ao relacionar com o Deus.
Tanto o jovem rico como o mestre da lei tinham por certo serem “perfeitos” adoradores de Deus. Mas não eram... Não adiantaria nada Jesus ficar batendo na tecla do “ame ao Senhor”, pois eles diriam (na cara dura), isso já fazemos! Na verdade, foi isso que fez o jovem rico, quando Jesus lhe apresentou a segunda parte dos mandamentos: tudo isso tenho obedecido! Por isso também a resposta cortante de Jesus: Contudo, algo ainda te falta! Ou...
Se queres ser perfeito...
Alcançar a vida eterna é em última análise o “chegarmos à perfeição”. E esse deve ser um alvo constante na vida de todo cristão. E ele deve ser seguido de atividades práticas: “vai, vende os teus bens, dá o dinheiro aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me”. Ou, “vá e faça o mesmo”.
Não costumamos dizer que a vida eterna se inicia aqui? Então a adoração perfeita que apresentaremos a Deus na eternidade, passa necessariamente pelo caminho da misericórdia no trato com o meu próximo aqui.
Se de fato em sua vida não existe mais lugar para perfeição, comece a devolver a ela esse espaço perdido. Ou seria roubado?
Jesus nos lembra que o ladrão vem senão para roubar, matar e destruir. Em nossa sociedade secularizada só dois dos mandamentos se tornaram categoricamente crimes inadmissíveis: o roubo e o assassinato. “Os outros oito mandamentos podem ser até quebrados, mas quando se trata de assassinato e roubo tem que haver um limite, uma punição!”
Mas é no sermão do monte que Jesus nos ensina que as raízes da obediência são muito mais profundas. A justiça exigida por Jesus é bem maior que a justiça farisaica de nossa sociedade.
Sabemos que nenhum homem foi capaz de cumprir os padrões de exigência da perfeição divina, exceto Nosso Senhor Jesus Cristo. Por isso quando buscamos perfeição, em última análise, estamos buscando a face de Cristo. Ele é a perfeição, a verdade absoluta e a nossa justiça.
E lembre-se, foi Ele quem disse, todo o que busca, acha! E quando O encontramos, ao contrário de sermos esmagados por um fardo, somos completamente aliviados. Somos salvos não da perfeição, mas pela e para a perfeição, pela e para a misericórdia.
Fique com Deus e um grande abraço!
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