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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

O pecado que não tem perdão (3)

Como eu ia dizendo, a parábola do servo inútil nos mostra, como já poderíamos imaginar, que existe algo além da letra, algo além do que nos foi mandado. Ela está ali para nos desafiar a irmos além.

Ir além, significa não necessariamente ter uma grande fé, mas uma fé viva, ainda que pequena.

O ir além pedido por Jesus, naquele contexto, implica em perdoarmos até mesmo sete vezes num mesmo dia. Sem a perspectiva da fé isso seria impossível.

Esse é o mecanismo que nos mantém longe dos escândalos. Que nos preserva de fazer algo que, segundo Jesus (figurativo ou não), seria pior que a morte.

Eis o porque viver na inutilidade é um pecado imperdoável. Porque com todo zelo estaríamos vivendo presos à lei e não à graça. Viveríamos debaixo da condenação e não da misericórdia.

Fazer apenas o que nos é mandado é viver uma vida longe do perdão: “Mas se não perdoarem uns aos outros, o Pai celestial não lhes perdoará as ofensas”. Não perdoar é um pecado imperdoável.

Não ir além é imperdoável, é uma ofensa, uma blasfêmia ao Espírito da Graça.

Quer mais um exemplo? O jovem rico. Disse-lhe o jovem: “A tudo isso tenho obedecido. O que me falta ainda?”

Se você quer ser perfeito, se quer ser como Deus, um amigo à altura de Deus, vá além da obediência: Per_doe. Naturalmente que o problema daquele rapaz relaciona-se diretamente ao perdão. Toda doação é uma “perdoação”. Os verbos dar (doar) e perdoar possuem a mesma raiz.

O pecado daquele rico (como acontece com a maioria deles) é imperdoável, pois eles não vão além das regras que lhe beneficiaram tanto. Eles se contentam em sentar-se à mesa sozinhos, longe da companhia de seu Senhor. Servos inúteis…

Nosso querido amigo Lou está corretíssimo em dizer que o pecado imperdoável é o cometido por Satanás. Afinal Satanás é tudo aquilo contra o perdão. Ele é como já se sabe o acusador. Ele é tudo contra a doação, ele veio se não para roubar, matar e destruir.

Quando Jesus em sua liberalidade, distribuía toda suas riquezas, e expulsava demônios aqui e ali, e perdoava incondicionalmente, uma multidão, carente, foi atrás dele. E também os guardiães das regras, enfurecidos, foram lá: “É por Belzebu, que ele faz isso”.

O problema daqueles caras, e isso pode não estar muito longe de nossos próprios problemas, é que eles (como nós também) não queriam se despojar como Jesus. Eles não queriam ir além dos mandamentos. A blasfêmia não estava, nem tanto, em achar ou falar que Jesus fazia aquilo por meio do diabo, mas em contentar-se apenas com a lei, com os mandamentos, com “aquilo que nos foi mandado”, com nossa zona de conforto. Eles tinham toda a riqueza da lei em suas mãos e não distribuíam àquela gente faminta. Eles não os perdoavam.

Será que sou diferente?

Será que quero o despertar de uma má consciência sem limites proporcionado pela literatura moderna como Camus, Sartre ou Simone Weil?

O que mais me poderia melhor forçar a ir além e ser um servo útil, um amigo, à mesa com meu senhor?

Que as regras sejam dadas aos chatos, e a liberdade aos amigos.

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