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sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Por que nem sempre é melhor ser feliz do que ter razão

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Já tive diferenças com pessoas pela internet, normalmente em comentários de Blog, geralmente discutindo algo ligado à teologia.

Não me conformo com as explicações simplistas para a causa de tais conflitos. Não creio que seja simplesmente "má fé" de um ou outro lado - como sempre deixa-se transparecer. Também discordo da afirmação de que seja só orgulho nosso... ainda que eu saiba que o orgulho nos acompanha, a nós todos, nesse exercício de blogar e discutir a fé.

As divisões não são por diferenças teológicas, mas por orgulho – Vaughan Roberts

Sei que religião é uma das três paixões que, juntamente com futebol e política, não se deve discutir. E isso já se explica bastante o porque dessas diferenças. Mas havia um outro elemento que me incomodava nessas discussões. Já discuti futebol e política com várias pessoas e sempre consegui me divertir apesar das irritações.

A predisposição negativa com a qual embarcamos nessas discussões é um elemento que me veio a tona essa semana. Tornou-se claro para mim, de fato, quando entramos com nossos preconceitos é muito difícil levar a coisa para o lado bom. Estamos predispostos a ler o que bem quisermos e denegrir a opinião alheia. Admito, também sou assim.

De grosso modo, a arena teológica brasileira atual está bem dividida entre liberalismo e fundamentalismo. Procuramos de antemão enquadrar o interlocutor em uma ou outra banda e, pronto, tempera-se tudo o que for dito. Basta uma simples provocaçãozinha para o caldo entornar.

Em minha última investida. Percebi que o pessoal fundamentalista está jogando a toalha quanto ao racionalismo e chegando à conclusão que “não sabem” tudo, que há limites para a lógica e assumindo a possibilidade do mistério. Pois bem, entrei num site que discutia o assunto e joguei minha isca e esperei a turma morder.

O que fiz foi dizer que Francis Schaeffer não era chegado no mistério [o que poderia fazer dele um racionalista sem fé, ou não]. Todos sabemos que Schaeffer é um dos progenitores do fundamentalismo, e que a todo custo queria provar que o cristianismo não era incompatível com o estudo e a reflexão.

Minha intenção foi somente levantar a poeira… recebi pauladas de todo tipo:

só posso lamentar [sobre isso]…, [você se] contradisse…, erro grosseiro de lógica…, você leu Schaeffer muito mal…, [venha com] menos mepareces…, [pare de] emitir opiniões sem a fundamentação adequada, ou mesmo flagrantemente contraditórias…

Recomendo fortemente que você comece a argumentar de modo decente…”

E depois de tanto baterem, ainda me acusam de me auto-colocar como vítima:

“Você não sabe conversar sem se colocar em posição de vítima da intolerância fundamentalista o tempo todo? Isso é muito desagradável. Cresça, meu caro!”

E os adjetivos prosseguiram até o ápice:

“confusão mental…”

Sim, uma vez que rotulamos nosso interlocutor, ou somos rotulados, tudo que se diz deporá contra si mesmo.

Tenho, porém, que frisar que essa rotulação será evidentemente mais dura, ou agressiva, pelo lado fundamentalista (ou conservador – como queiram). E isso pela simples razão de que o fundamentalismo odeia meio termos. Eles anseiam por um rótulo, por uma definição, por uma norma ou regra. Eles se sentem mal diante de algo nebuloso. Eles se contorcem e chiam diante de algo indefinido. E não os culpo ou acuso por isso, é uma mentalidade que pode até ter sua validade.

Creio que esse fator, justamente a dicotomia, o conflito, entre definição e indefinição, absoluto e relativo, é o elemento que causa o principal ruído das discussões que protagonizei e assisti na Blogsfera. Conservadores não trabalham com sínteses. Tudo será requerido na base da, ou é tese ou antítese.

Por isso, esses pseudo-diálogos serão como conversa entre duas  pessoas de línguas diferentes, um conversa em russo o outro em chinês; ou o diálogo entre dois sistemas operacionais distintos, um programa Linux tentando rodar no Windows.

  • Falamos cinza, eles querem preto ou branco (principalmente em se tratando de fé, moral, Deus, eles não aceitam tal incerteza)

  • Falamos “me parece”, eles querem fundamento

  • Falamos diversidade, eles perguntam por argumentos universais

  • Falamos flexibilidade, eles respondem rigidez

Tenho que denunciar também que, ao contrário daqueles com tendências liberais, os conservadores estão mais predispostos à caça às bruxas, pois há uma ortodoxia a ser defendida. O liberal quer obviamente defender seu liberalismo e pode também chegar ao belicismo, mas é, por razões óbvias, mais tolerante. Diria que o fundamentalista briga pelo conteúdo da discussão, o liberal pela forma da discussão. Um quer defender o ponto “soberania de Deus”, o outro quer defender as diversas formas de se entender “soberania de Deus”.

Apesar desse agravante “caça a Bruxas”, o que impede mesmo o diálogo – assim entendo – é a incompatibilidade de sistemas argumentativos. São duas frequências diferentes e não há sintonia e não há como ter. Aliás, o conservador tem na argumentação belicosa algo desejável, uma luta intelectual que, a seu ver, irá fortalecer os músculos de seu cérebro e enriquecer seu próprio arsenal lógico. Quanto mais se argumenta mais se refina e mais se separa o branco do preto. Apologética é tipicamente fundamentalista!

Eu particularmente não gosto disso. Me esforço por ver as diferenças de nuanças. Me alegro ao ver que a mistura de cores produz algo novo. Por isso o liberalismo (ainda que eu não me veja como um liberal) está à procura do diferente, para oferecer-lhe espaço.

Eu sei que minha interpretação é limitada e falha em alguns pontos. Mas é a “minha”.

2 comentários:

Anônimo disse...

Não entendi nada do que você falou, mas como cientista, interpretei à luz da teoria da incomensurabilidade dos paradigmas de Khun... Eu também faço parte da turma que acredita que tudo é tão incerto que dois paradigmas podem até se completar! Mas não é só na religião que os bicudos não querem se beijar não! É pra todo lado! Beijar dá um trabalho! Então, um beijo! Elisa (não conheço etiqueta de blog... A gente pode deixar beijo ou é brega?)

O Tempo Passa disse...

Elisa, pode beijar à vontade... na blogosfera não faz mal... eu até me senti beijado!
E vc descreveu uma grande realidade: essa história dos bicudos acontece em todas as áreas... e é um saco!
O que torna flagrantemente pior esses "embates" teológicos é que eles se dão no contexto do "Deus é amor", "ame o próximo como a ti mesmo", o que não acontece em outros ambientes, certo?
Agora, que o nosso amigo aqui gosta de provocar, isso é certo!!!!
Bj