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sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Introdução ao Cânon do Novo Testamento


Essa é uma cópia de um texto que um amigo meu pediu para eu escrever sobre a questão da canonicidade do NT, e por ser pertinente ao blog eu aproveito e posto aqui. Fiquem livres para debater, já que eu não domino o assunto.

Certamente, uma das questões mais polêmicas e controversas quando falamos da fé cristã é a questão da formação do cânon neotestamentário. Apesar do fato de nenhum grande acadêmico do novo testamento, independente de sua (des)crença, acreditar ou corroborar as questões que o público leigo levanta, como aquelas levantadas pelo O Código Da Vinci, ainda assim paira uma nuvem de dúvida na cabeça de todos: Como se deu a formação do Cânon do Novo Testamento? Porque foram 4 os evangelhos aceitos e não mais (ou menos)? Porque Marcos, Mateus, Lucas e João e não Maria Madalena, Filipe ou Tomé?

Quando alguém, com aquele ar de triunfo na face, levanta tais questões eu gosto de fazer três perguntas:

1) Você já leu os Evangelhos?
2) Você já leu os Textos Apócrifos?
3) Porquê você acha que os Textos Apócrifos deveriam entrar no Cânon Neotestamentário?

A resposta dificilmente será positiva para as 2 primeiras questões e para a 3º no máximo será um incômodo silêncio. Isso por si só já é suficiente para revelar as bases fragéis sobre as quais repousam essas críticas e também revela que o motivo para rejeitar o Novo Testamento e a fé cristã tem suas origens mais na vida emocional do incrédulo leigo, ou seja, na sua rebeldia contra o Cristianismo, do que em formulações intelectuais.

A questão é que quando as pessoas levantam tais questões elas sequer sabem do que estão falando! Quem faz a afirmação é que detêm o ônus da prova mas, para essa questão faltam argumentos sólidos e sobram "achismos" e divagações infundadas.

Mas vamos assumir o ônus da prova e apresentar fatos.

O consenso no meio acadêmico é que os textos do Novo Testamento foram todos escritos entre 59 - 90 d.C. alguns ainda colocam o Evangelho de Marcos no ano 40 d.C., ou seja, apenas 7 anos após a morte de Cristo. Esse período de tempo é muito breve para que os textos se tornem vitimas de desenvolvimento legendário ou que os fatos históricos se deturpem a ponto de perderem sua valor histórico. Só como comparação, a biografia de Alexandre, O Grande foi escrita 300 anos após sua morte e justamente por esse longo espaçamento de tempo sua biografia apresenta um alto nível de desenvolvimento legendário. Mas com Cristo não, sua primeira biografia foi escrita entre 10 a 30 anós após a sua morte, em outras palavras, estamos falando de um documento de altissimo valor histórico por ser incrivelmente próximo dos fatos impossibilitando qualquer deturpação substancial.

É isso que faz com que os textos do Novo Testamento sejam historicamente confiaveis de modo que sua confiabilide não têm paralelos com nenhum outro texto antigo seja de Platão, Aristóteles, Homero, Flávio Josefo etc...

Mas e o Evangelho de Maria Madalena? Filipe? Tomé? Pedro? Todos eles datam de meados do século II, ou seja, de 150 d.C. em diante. Aproximadamente 120 anos após o fatos. Tardios demais para descreverem os fatos com precisão e relevância para o conhecimento histórico. Além do fato de que é impossível que os autores a quem se atribui a autoria de tais "evangelhos" ainda estivessem vivos. Quando o Cânon Neotestamentário foi decidido pela Igreja um dos principais critérios de canonicidade era a apostolicidade ou seja, ter sido escrito por um dos apóstolos (Mateus, João, Paulo...) ou por alguma pessoa próxima destes (Marcos, Lucas...) critério que nenhum texto apócrifo pôde resistir. Deveríamos inclui-los no cânon? Seria uma incrível besteira colocarmos textos tão historicamente pobres ao mesmo lado dos textos do Novo Testamento. Curiosamente, segundo os historiadores da era antiga, as lendas costumam se desenvolver a partir de 2 gerações (80 anos) após a ocorrência dos fatos, ou seja, exatamente o período em que começaram a surgir os textos apócrifos! Eles não passam de lendas. Mas não pára por ai, diferentemente dos Evangelhos Canônicos que apresentam inúmeras citações de locais geográficos, sacerdotes, pessoas importantes, detalhes que podem ser comprovados a partir do estudo da histórica antiga, os Textos Apócrifos são apenas coleções de idéias de mestres do gnosticismo do segundo século, não há nada que possa ser comparado com o que conhecemos da história antiga, nenhuma citação de local ou de alguma figura pública da época, nada. E, talvez o mais importante, diferente do que se imagina esses livros jamais foram aceitos pelos cristãos antigos como alguns acreditam, nem sequer por líderes eclesiásticos ou algum dos Pais da Igreja. Não temos citações desses livros nos escritos dos Pais da Igreja (90 - 180 d.C.) mas temos inúmeras citações dos textos canônicos, para ser mais preciso, praticamente 95% do NT é citado pelos Pais da Igreja. O Fragmento Muratório, que é um papiro datado de 180 d.C., é uma das primeiras tentativas de estabelecer o Cânon das Escrituras Neotestamentárias, nele encontramos 22 livros contidos no nosso NT atual, incluindo os 4 Evangelhos. É possível que algum outro texto seja citado mas pela deterioração do manuscrito não é possível saber, mas a grande questão é cadê os textos apócrifos? Não aparecem...

Para selar de vez a sepultura dos textos apócrifos aqui vai uma citação do Evangelho de Tomé:

"Simão Pedro disse a eles: 'Maria deveria deixar-nos, pois as mulheres não são dignas da vida'. Jesus disse: 'Eu a guiarei para fazer dela homem, de modo que também ela possa tornar-se espírito vivo semelhante a vocês homens. Pois toda mulher que se tornar homem entrará no reino do céu".

Em outras palavras, a menos que as mulheres se tornem homens elas terão como destino eterno o inferno.

Recapitulando, os textos do Novo Testamento têm um valor histórico muito maior do que qualquer texto apócrifo por serem mais próximos dos fatos, terem sido escritos por testemunhas oculares ou pessoas próximas a estas, apresentarem inúmeros dados que podem ser acessados através da história e desde sempre terem sido aceitos pelos cristãos primitivos. Já os textos apócrifos não resistem a nenhum desses critérios. Por que deveríamos atribuir historicidade à tais textos? Não resta motivo algum.

11 comentários:

Alice disse...

Oi Roger !! ... achei vc aqui na Blogosféra e não resisti em adcionar-te aos meus favoritos !!
Espero que tudo vá bem contigo.
Adorei o texto , muito bom !!
Valeu !

bjkas pra vc


www.alicenopaisdopensamento.blogspot.com

www.verdadesnuas.blogspot.com

Anônimo disse...

Roger,
Teologia Livre (muito bom!)também foi adicionado aos meus favoritos.
Cheguei aqui através do blogue da Norma.
Mas foi o conselho que antecede o espaço do comentário que me causou impacto, a ponto de provocar a escrita de meu último post.
Aguardo sua visita.
Um abraço
Raquel

Anônimo disse...

Roger,
preciso acrescentar:
"...a escrita de meu último post" em meu blogue!
Obrigada

ROGÉRIO B. FERREIRA disse...

Amigo Vítor,

espero não te escandalizar com o que irei escrever... tenho que conversar mais com o povo aqui para saber se esse tipo de dúvida os inquieta... ou se o problema está em outros poréns.

Mas vamos primeiro à parte mais light: Gostei do seu texto. A definição do Canon é mesmo algo intrigante. Seus argumentos são muito bons e verdadeiros. Mais do que isso apontam para o fato de que a mão divina nos guia para um documento inquestionavelmente confiável, quanto às nossas questões espirituais na busca e convívio com Ele.

Li há algum tempo um livro alemão baseado em uma série de TV holandesa, "como a Bíblia foi criada", e é um show de história e apologética, mostrando como temos um solo firme para nos apoiar em nossa caminhada cristã. Outro livro interessante é o próprio história ilustrada do cristianismo, ali por exemplo estraímos como foi necessário na época o agrupamento de livros que combatessem as heresias de Marcion. Isso sem falar no More than a Carpinter...

Lembro-me que na época de minha conversão há 20 anos, me contetei com um argumento que eu mesmo desenvolvi com a ajuda da minha irmã: se Deus é Deus e permite que um livro assim seja aceito como sua palavra, deve ser verdade. Naquela época não entendia nada de apócrifos...

Em épocas de crise tais argumentos histórico-científicos me ajudaram a reafirmar para mim mesmo que a Bíblia é A Bíblia!

Hoje, porém trilharia outros caminhos. Examinaria à luz de um Marx, se isso fosse possível, como as pessoas daquela época decidiram por um livro e não por outro. No fundo acho que muito do que vc escreveu já passa por essa análise histórica. Mas iria mais a fundo ao tentar descobrir as ideologias da época, os modos de produção, os conflitos de classe e as "razões" e fatos (materiais) que levaram aqueles santos homens do segundo e terceiro século a escrever e chancelar nosso querido Novo Testamento.

Iria a fundo nessas 95 por cento de citações, e outros 5 por cento? Em qual contexto elas aparecem ou não?

Tudo isso não por mero exercício filosófico ou científico. Não, mas por acreditar que hoje precisamos também tomar nossas escolhas para mudar a situação em que estamos e oferecer para as gerações futuras um cristianismo mais coerente. Deus irá interferir, sim, mas esse milagre hoje depende de nossa ação proativa também.

Ninguém naquela época imaginava escrever um livro, agrupar um ou excluir outro, para que as gerações do ano de 2008 tivessem um Bíblia confiável em seu PC!! Nem creio que Deus apareceu em sonho ou visão e disse escreva isso ou aquilo! Estou convicto, que foram situações concretas, anseios, problemas e euforias bem humanas, mas bem santas que fizeram os santos homens de Deus produzirem algo tão valioso para nós.

Se melhor entermos este processo poderíamos melhor imitá-los.

(nossa... acho que nunca escrevi um comentário tão grande!)

Então paro por aqui.

Abrçs,

Roger
PS: um último pensamento, fico embasbacado com a atitude de Jesus que frente à hipocrisia dos escribas e doutores da lei de sua época, escolhe o caminho da simplicidade das parábolas, em vez de estudos do velho testamento, dos profetas e etc. Não nego que Cristo usou as escrituras (não sou tolo a esse ponto), mas é óbvio também que o Galileu preferiu sempre uma linguagem menos erudita, menos formal, menos bíblica, por mais que gostamos de disso ou não. No fundo ele falou pouco de Biblia, mas viveu em sua plenitude.

Anônimo disse...

Para os amantes do português, tem um vídeo super engraçado aqui: Pleonasmo

ROGÉRIO B. FERREIRA disse...

Que bom Alice,
sempre de vejo nas rodas de comentários.
As coisas vão bem comigo, ainda não do jeito que queria, mas vão caminhando. Mas como disse o Brabo, há sempre uma cruz no fim do túnel.

beijos pra ti também!

ROGÉRIO B. FERREIRA disse...

Oi Raquel,

ó gent´, uma baina no pedaço!
As pistas de Gongim são ótimas. Elas cortam mesmo para os dois lados, aquilo ali, com certeza, o Ricardo aprendeu numa escola muito dura.
Então aproveitemos um pouco disso, sem ter que passar pelos mesmos desgostos que ele já passou para aprender.

Abraços pra ti também!
Roger

Anônimo disse...

Achei o texto excelente!

É incrível como a maioria dos críticos do NT nunca o leram. "Não sei porque, mas sou contra".

ROGÉRIO B. FERREIRA disse...

Clóvis,

muito obrigado pela visita e comentário.

Essa observação do Vítor faz mesmo uma grnade diferença: o pessoal às vezes chega-se a nós com algumas pedras nas mãos, mas baseados em preconceitos. Nesse caso temos que ter a sabedoria para redarguirmos e dasarmá-los. Para essas situações os calvinistas são realmente bons!!

Abraços,

Roger

TecSinger disse...

Adorei o texto!!

Nossa, não sabia que o livro de tomé falava isso,...que horror!!!E ainda querem incluí-lo na bíblia,...nossa,...no coments,..

Vou passar por aki de vez em quando,...=)

beijoss
Paz

A. Andr@de disse...

Olá. Em primeiro lugar, parabéns pelo blog, muito instrutivo e bem escrito. Gostaria de comentar livremente sua postagem esperando poder contribuir para futuras questões e textos seus. Não sou especialista em Novo Testamento mas pelo título da postagem confesso que esperava outra coisa. Você acabou se prendendo às discussões sobre os textos apócrifos onde seria muito interessante discorrer sobre a formação (mesma) do Cânon do NT. Eu li seu aviso: “eu não domino o assunto”. Eu também não, mas, de repente essa postagem seria a possibilidade de um interessante início de conversa e troca de ideias. Um grande abraço e sucesso!