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domingo, 4 de julho de 2010

Porque acredito no destino

É muito divertido ver cristãos afirmarem convictamente que o destino não existe e por outro lado, sem pestanejar, acreditarem piamente na predestinação. A explicação seria que para eles o destino seria uma entidade a parte, separada da divindade, quase uma outra divindade; enquanto a predestinação seria uma ação do Deus judaico-cristão.

Eu acredito no destino, no sentido mais restrito da palavra, que é “onde” se chegará um dia. “Onde” pode ser um lugar ou uma situação de vida. Se você pega um ônibus com destino a Camboriú, pode-se dizer que, com boas chances, seu destino já está traçado e em algum tempo você chegará a ele: Camboriú. Todos nós somos em certa medida donos de nosso próprio destino.

Sobre o termo predestinação já falei certa vez, ele compreende um pleonasmo em si mesmo, afinal toda “destinação” é e só pode ser “pré”. Mas se entendermos que a predestinação é um destino traçado por Deus, e que esse destino é muitas vezes fixo e imutável então teria também que admitir que creio na predestinação.

Eu creio no destino no seu sentido mais amplo. Acredito que boa parte de nosso futuro está escrito nas leis naturais e muito dificilmente fugiremos dele. Creio porém que alguma parte dele já foi desejado e planejado por Deus e também teremos pouca probabilidade de escaparmos dele.

Se você estiver atento à minhas afirmações perceberá que eu deixei espaço suficiente para introduzir um outro termo que também já chamei de pleonasmo: o (livre) arbítrio, afinal todo arbítrio tem que ser livre, se quiser ser arbítrio. Remedando o Brabo (se é que essa idéia ainda não foi por ele reformulada) também digo:

Não creio que Deus tenha como conhecer antecipadamente a decisão livre que um homem vai tomar no futuro.

Eu sei que é constrangedor para nós cristãos admitirmos, após vários séculos, que Deus não é tão onisciente assim como apregoamos. O fato é que ainda que Deus tivesse o poder para saber o que eu ou você escolheremos para fazer amanhã depois da janta, Ele simplesmente prefere ficar educadamente de fora. Até mesmo em situações em que insistimos com Ele para que venha e decida por nós ou ainda conosco, ele se limita a deixar toda a responsabilidade e autoridade da escolha sobre nossos ombros, por uma simples questão de liberdade e amor.

E aqui gostaria de destacar dois pontos que, sem eles, não chegaremos nunca a entender nosso relacionamento com Deus. Meu pai gosta muito de citar São Vicente de Paulo que segundo ele alguma vez teria dito:

“Confio como se tudo dependesse de Deus; ajo como se tudo dependesse de mim.”

Embora essa frase pareça esconder alguma sabedoria (como na verdade acontece com tudo que nossos pais falam nesse tom), ela só vem esconder a verdade que seria uma formulação mais ou menos assim:

Confio e ajo como se quase tudo dependesse de Deus e quase tudo de mim mesmo”.

O tudo aqui significa nada mais nada menos que nosso destino, nosso futuro. De quem ele depende afinal? Tanto de um como de outro!

O problema é que, e agora vou ao primeiro ponto a ser destacado, à semelhança de G. K. Chesterton (e tantos outros) queremos situar Deus fora do tempo e do espaço. Se Deus está situado de fato fora do tempo ele não é o Deus brasileiro que tanto acreditamos e muito menos o Jesus Cristo descrito nos Evangelhos.

“Eu sou aquele que era, que é e que há de vir”. Desde o início Deus já se movia, agia dia a dia, e estava sujeito às maravilhas e revezes do tempo. Em Cristo, Ele só veio deixar isso escandalosamente patente. Se deixamos Deus fora do tempo, aí mesmo é que não poderemos falar de predestinação, nem plano divino, nem nada sobre Deus, a encarnação, crucificação e ressurreição seriam ridículas. Você pode até me falar que Deus é bem maior que o tempo ou espaço, mas não me diga que ele se situa fora dele. Em caso de dúvida visite um doente ou um preso, dê de comer a um faminto, vista um descamisado, sem dúvida alguma você encontrará Deus neles, de forma bem concreta situado no tempo e no espaço.

Uma vez entendido que Deus se situa também no tempo, teremos que entender um outro ponto para avançarmos no nosso relacionamento com Ele, quando o assunto em pauta é o nosso destino: Deus faz suas próprias escolhas. E esse é o meu segundo ponto. Mas falemos sobre isso uma outra vez…

(Continua)

Um comentário:

Anônimo disse...

Adorei o texto.

e amei a frase de são vicente de paula... é isso mesmo!

Abçs!!!

Silvia j